15 de outubro de 2006

Revolução digital e novo perfil do professor

Diário de Pernambuco - Edição de domingo, 15 de outubro de 2006

Antônio Carlos Xavier
PROFESSOR DA UFPE

Carmi Ferraz Santos
PROFESSORA DA UFRPE

Sem dúvida o novo século trouxe muitas mudanças nos mais diversos setores da sociedade, uma delas já bem amadurecida na última década do século passado. Ttrata-se da revolução digital. Ela afeta a todos e, por isso, também os educadores. As tecnologias digitais de comunicação e informação, antes de serem concorrentes ou substitutas dos professores como apregoam alguns, são suas mais novas e eficientes aliadas. Seu potencial pedagógico é incomparavelmente maior ao quadro, saliva e giz tão comuns nas escolas brasileiras. Muitos professores ainda vêem de soslaio os benefícios das tecnologias aplicadas à educação que têm sido alardeados por alguns tecnófilos. Entretanto, até os mais céticos tecnófobos não são capazes de negar a "invasão" dessas máquinas nos ambientes escolares.

A Internet é uma realidade incontestável. Mas o que fazer diante dessa nova realidade? Ignorá-la como se nada estivesse acontecendo escondendo a cabeça no buraco como faz a avestruz? Esperar que a "onda tecnológica" passe como se fosse "só um modismo"? Ou admitir sua chegada, reconhecer a necessidade de conhecê-la, identificar suas características a fim de dominá-la para utilizá-la adequadamente dentro desse novo contexto? No momento, essas nos parecem as alternativas mais sensatas a serem consideradas pelos educadores.

Resultados de pesquisas sobre leitura divulgadas em setembro de 2005 mostram que o Brasil ainda possui problemas fundamentais de compreensão de texto (apenas - da população brasileira consegue ler com proficiência), o que revela um problema mais grave ainda: o nível rudimentar de alfabetização no qual - da nação se encontram hoje. Dados como esses deveriam servir de argumento para convencer os responsáveis pelas políticas públicas de educação a implantarem urgentemente programas de capacitação docente focados no aproveitamento do potencial pedagógico das tecnologias digitais hoje bastante conhecido, comprovado e à espera de utilização.

Jáestá mais do que na hora do governo contra-atacar o problema central da ignorância brasileira com aplicações de overdoses financeiras na formação e capacitação tecnológica dos docentes, bem como na aquisição de máquinas computacionais avançadas a serem disponibilizadas em nossos espaços escolares. O discurso de que é preciso primeiro tornar todo o "Brasil Alfabetizado" para só depois poder investir em aperfeiçoamento dos professores e em laboratórios de informática tem, ano após ano e governo após governo, inibido a tomada de atitudes mais arrojadas que poderiam enfrentar o atraso intelectual e tecnológico que impede o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida da maioria do povo brasileiro.

Os novos tempos exigem por parte do Estado uma substancial injeção de recursos no sistema nacional de educação para adequar a escola e o professor ao seu novo perfil imposto pelas inovações tecnológicas: mais pesquisador e menos repetidor de informação, mais articulador de saber e menos provedor único de conhecimento, mais gestor de aprendizagens e menos instrutor de regras. Na nova ordem mundial econômica e tecnológica, o docente deve atuar mais como um consultor que sugere do que como um chefe que manda. Isso porque o acesso da nova geração à rede mundial de computadores tem lhe permitido mais liberdade de expressão e mais interatividade. Nessa perspectiva, há pesquisas com adolescentes da América, Europa e Ásia revelando que quanto mais eles usam as parafernálias digitais mais ganham autonomia de aprendizagem, aguçam a curiosidade e o faro investigativo, dilatam sua sensibilidade emocional e intelectual, ampliam sua preocupação com os acontecimentos globais, além de aumentar a consciência de seu papel e de sua responsabilidade social, quando comparados à geração de seus pais.

Portanto, governos e professores não podem mais ficar como "Carolina" à janela esperando a banda tecnológica passar, pois quando perceberem talvez ela já tenha dobrado a esquina da história e a história da nação brasileira continuará acumulando déficits intelectuais, tecnológicos e com baixa qualidade de vida.

Novo pacto político nacional

Inocêncio Oliveira
DEPUTADO FEDERAL POR PERNAMBUCO (PL)

Para um novo quatriênio (2007/2011) propõe-se um novo pacto das forças políticas que leve o País a um crescimento sustentável do PIB em torno de, pelo menos, 6% a.a., pois "o desenvolvimento é, necessariamente, um processo de conserto nacional" como assinala o documento do CDES - Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social - divulgado em agosto último. Essa meta econômica se concretizará se continuar a haver manutenção do controle da inflação; juros progressivamente menores; superávit na balança comercial; diminuição da dívida pública; investimentos em infra-estrutura; redistribuição de renda com divisão do poder político; etc.

O poder político nas sociedades modernas, apóia-se em estruturas administrativas ágeis, profissionais, que devem operar com eficiência e eficácia, recrutando-se os melhores elementos pelo método do concurso público ou da prova de títulos, porque há talentos acadêmicos - isto é, formados pelos campos universitários - e inacadêmicos, com experiências e vivências de que a administração pública não pode prescindir. É possível atingir um PIB real "per capita" de R$ 25 mil em 2015? Sim, desde que se unam as forças políticas mais responsáveis para que, ao lado dos investimentos econômicos se promovam, dentro do Orçamento Geral da União, os ajustamentos necessários à promoção do social, incluindo programas e projetos objetivos de financiamento à construção de moradias de interesse social (baixos juros + longo prazo de amortização), saneamento básico, serviços comunitários (quadras poliesportivas, centros de saúde, teatro e cinema, núcleos de artes cênicas e plásticas), transporte público, abastecimento alimentar.

É preciso porém, que os 27 Estados dêem a sua parcela de contribuição renunciando à guerra fiscal e eliminando impostos e taxas e baixando, na prática, o chamado "custo Brasil". Mais ainda: é necessário redirecionar os investimentos dos Estados para financiar programas e projetos sociais de cunho participativo, deixando queas comunidades decidam o que é melhor para elas próprias: enfim, estender, na prática, o orçamento participativo.

A expectativa do CDES é de que o BNDES possa aplicar, nos próximos 10 anos, recursos no valor de R$ 650 bilhões no financiamento de projetos industriais e de infra-estrutura no Norte e Nordeste, contribuindo para a formação daquelas "economias externas" indispensáveis à eficiência dos investimentos privados, principalmente em regiões de baixos níveis de poupança, como o Norte e Nordeste do Brasil. Outros temas poderão ser aqui assinalados nesse programa que o Presidente Lula terá condições de consolidar: a diversificação da matriz energética brasileira, com maior ênfase aos bio-combustíveis (etanol, biodiesel, H-bio); universalização do saneamento básico; apoio continuado às micro, pequenas e médias empresas; reestruturação agrária, com a distinção entre terra de trabalho e terra de negócio.

E, finalmente, teremos de vencer a batalha da segurança pública, com apoio às iniciativas de reestruturação e aperfeiçoamento das Polícias Federal e Estaduais. Este é o escopo básico de um programa coerente de governo, a partir de 2007, que terá de contar, para o seu sucesso, com o apoio dos Poderes Legislativo e Judiciário.

Bom-dia, Recife

Ronildo Maia Leite
JORNALISTA

Como a primeira mulher, o primeiro chope é de mera ambição ou a descoberta da sede. Os que a ele e a ela se sucedem é a consagração das madrugadas. Freud não seria tão simples nem moleque: a primeira mulher é a presença da mãe e o dengo da irmã mais velha. As seguintes, o inocente dormir na cama da prima, a descoberta da vizinha, a intimidade com a colega de escola, o leve roçar de pernas e das partes na primeira dança, o vento levantando a saia da menina, o lance de calcinha da moça se agachando. Ou de pernas se cruzando na franqueza geral da minissaia.

Isso eu aprendi logo cedo, camaradas: se o seu olhar de inteiro couber lá dentro do olho da menina, não a espie de novo. Nem de frente. Os olhos fecham contratos secretíssimos. É de curvas o olhar dos que se querem, camaradas. Está, esse querer-se, nas mãos agarrando o copo, No se mudar de posição na mesa, no ouvir sem dizer, no dizer pra não se ouvir. No pé por debaixo da cadeira - há conversa mais franca do que a dos dedos,camaradas? No absoluto silêncio, na algazarra. E até no "tudo bem?", no alisar o cangote, no nhanhã do beijim.

O primeiro ato de amor, o amoreco, é um amorar-se em si mesmo, o sexo ardente numa mão, na outra a mulher que não se tem, embora cobiçada. Tenho ser esse ato de amor o delírio do nada, pois as mãos que digitam o próprio corpo, com toda a certeza de mulher sabem somente de retratos. Eis aí a ortodoxia de um desastre, camaradas.Mania ou amor demais essa maneira minha de mulheres cortejar? Logo cedo, minha mãe desconfiou de mim. No Natal, me deu um brinquedo de pilha, um par de luvas de box, um patim, um saco de bolas de gude, futebol de mesa, um jogo de xadrez, essas chatices. Se esqueceu que minha prima gostava mesmo de um ganzá.

De tarde, lá estávamos, eu e Dora, no quintal. Minha mãe ralhou comigo, Deus a tenha, camaradas. Meu pai se fez de desentidido, e foi embora. Não me olhou de frente, por isso entendi o seu olhar... Empedernido de nascença, hoje estou aqui, meio aluado. Cidadão quarto minguante. Caindo pelas tabelas, sou um homem quase nada, um quase morto, um fulano qualquer. Mas ainda arranjo companheiras, camaradas. Ontem, boquinha da noite, sentamos eu e a Gordinha no primeiro bar. Sorrimos, eu e ela, um sorriso único. Feito o primeiro chope, que é a glória da sede, o primeiro sorriso da mulher sinaliza o que pode ser a madrugada. A Gordinha tinha eriçado o bico dos peitos, como somente os têm as mulheres noturnas. Baton nenhum, lilaz que fosse. Nenhuma sombra nos olhos. Nem enfeites. Ai, eu juntei as gambiarrras coloridas do puteiro, fiz um trancelim de lâmpadas, e coloquei no busto da Gordinha. Olhando o mar do porto, ela me perguntou, então:

- Cansado?...

- Não, um pouco doente. Uma dor aqui, de lado.

- Fadiga, ela insistiu.

A dor é um recado de saúde do orgamismo à outra parte do organismo que adoece, inclusive a alma. Aí, a Gordinha se arretou, descansou os dois peitos na bolacha de chope e me falou baixinho:

- Curiosa a fadiga de que muitas vezes você se reclama.

Osprazeres originais da espécie humana, no entanto, muitas vezes dependem da fadiga, ou a ela antecedem para depois partilhar, com ela, um gostoso relaxamento. Cansados, adormecemos depois de uma dor, de um grande esforço, de um grande prazer...

Qualquer atividade depende da fadiga para restabelecer seus limites. E é por causa dela que o Livro dos Recordes atravessa os tempos, surpreendendo-nos a cada quebra de marcas. Embora seja o sono seu maior favorecido, é ela também que favorece os ciclos da natureza, as interrupções das brigas. A noite é a fadiga dos dias que, no entanto, se repetem. A velhice a fadiga da juventude que, no entanto, permanece dentro de nós. O silêncio é a fadiga do discurso que, no entanto, recomeça em todos os temas. Do mesmo modo, os filhos são a fadiga dos ciclos da vida, que se repete depois que descansa nos intervalos das gestações. Do mesmo modo que a amizade é o cansaço do amor, que, arrebatador, também cansa de fervilhar. Do mesmo modo que o frio é o cansaço do calor que, de tanto fatigar, também precisa descansar.

Dos direitos naturais da espécie, poucos permanecem tão accessiveis quanto a fadiga que, no entanto, não perde seus encantos jamais. A fadiga que sucede o sucesso, que nos faz descansar, que nos faz desistir ou começar a lutar, é um reptil de duas cabeças que com uma morde e com a outra sopra.

Fadiga em tudo é a morte que, no entanto, apenas cancela o próximo jantar. Porque depois vem a vida, e com ela a história que então se repete. Curiosa a fadiga das mãos que escrevem tão devagar os pensamentos que vão mais rápidos que elas. Curiosa e demente, pois não liga se eu reclamar."Quando ela acabou de falar, fatigaram-se até as ondas do Atlântico. Ela pegou o seu fusquinha e foi embora. Eu beijei um amuleto que trago no peito desde a infância. Cheguei no pé da escada do puteiro e gritei:

- Dona Lalu, onde você escondeu a minha infância..."

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Fonte: http://www.pernambuco.com/diario/2006/10/15/opiniao.asp

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